Machismo, um grande problema de saúde

machismo

Pode parecer absurdo, mas em pleno ano 2014, ainda é comum vermos o machismo predominando. Esta constatação não é diferente quando o assunto é cuidar da saúde. Muitos homens ainda têm resistência em procurar um médico e, principalmente, admitir e aceitar uma doença. A situação se agrava ainda mais quando falamos de depressão ou dependência química. “Depressão é frescura”, muitos machões devem pensar. Ou ainda, “eu não sou viciado, paro quando quiser”, repetem para si mesmos aqueles que percebem a fraqueza, mas preferem se enganar com uma frágil postura de encenada bravura.

Em grande parte isso integra nossa cultura latina machista. Ou seja, o homem é o forte, o que não se quebra, não se abate, que acaba por redundar naquela velha máxima de que homem que é homem não chora. Uma das coisas mais comuns que a gente ouve na psiquiatria, que o leigo costuma dizer, é que os problemas psiquiátricos, principalmente a depressão, são sinais de fraqueza. Muitos homens de quem eu tenho tratado, e trabalhando depois em cima do que tinha acontecido, chegam à conclusão de que agora é que eles são fortes, que antes eram extremamente fracos.

Obviamente existe uma grande resistência masculina em relação a qualquer tratamento de saúde, mas quando falamos especificamente de problemas psiquiátricos e dependência química, é fato que ter o diagnóstico correto e admitir a doença não é fácil também para as mulheres. A depressão é uma patologia muito democrática, pois pode atingir qualquer idade, classe ou gênero. Estima-se que 80% das pessoas com depressão sejam tratadas por não psiquiatras ou, o que é impressionante, não são tratadas. Na prática clínica a maioria das pessoas portadoras de depressão procura inicialmente um clínico geral e/ou neurologista, já que o próprio conceito de doença mental se encontra distorcido na sociedade, sendo confundido com outro não médico ou científico dito“loucura” (tudo que é mental, é loucura, sem que realmente se defina o que este termo significa) por isso ainda há muita resistência em procurar um psiquiatra, supostamente especialista nessa tal loucura. No entanto, diagnóstico de depressão vem sendo reconhecido como um sério problema de saúde pública.

Existe menos preconceito do que já existiu, principalmente porque os profissionais da área da saúde se convenceram de que depressão não é frescura. Aliás, seria uma frescura muito curiosa, a única delas capaz de levar à morte. Não só morte por suicídio, como muita gente imagina, mas também por descuidos com a saúde, pois o depressivo tem uma distorção em relação a si mesmo e acaba se cuidando menos. Quando o depressivo vai tratar outros problemas com diferentes profissionais, ele é um paciente muito difícil, pois não tem aderência, não tem comprometimento com o tratamento. Ele não cria vínculos nem com o profissional que o está tratando nem com o processo terapêutico. Então pára no meio do caminho, retorna com os sintomas, troca de profissional.

Outro fato a considerar é que a depressão favorece a dependência química, pois o paciente busca nas drogas a solução, um pretenso tratamento. E se essa depressão está ligada a um quadro de transtorno bipolar, as chances de que o indivíduo busque a solução em vários tipos de drogas é enorme: busca pela droga calmante quando está eufórico ou alguma substância estimulante quando está deprimido.

É difícil aceitar a dependência química pelas implicações sociais, a marginalização, a prática ilícita, dependendo da substância. Podemos imaginar como seria para nossos empregadores descobrir isso? Mas não que a depressão não seja constrangedora. A depressão mais desdenhada é justamente a leve, pois como é menos acentuada, tem manifestações mais próximas da vida normal de todos nós, mais facilmente será confundida com situações existenciais muitas vezes perto da simulação, com ganhos secundários. Claro que a frescura existe, assim como quadros depressivos leves. Os casos mais leves são os que mais cobram do paciente em termos de sofrimento, pois a situação é levada com a barriga, sem que o diagnóstico seja feito.

Se existe um mito que precisa ser desfeito é o de que o homem é um pedaço e não o todo. Existem situações em que o físico é o que está evidente, mas pode estar mascarando problemas psiquiátricos. As depressões moderadas podem se manifestar em forma de dores, musculares e de cabeça. Então, se há um conselho que pode ser dado aos homens, eu diria, sejam machos e procurem o médico regularmente, e imediatamente se houver algum sintoma que desperte preocupação. O primeiro passo para a qualidade de vida é combater o medo disfarçado de machismo.

Élio Luiz Mauer é psiquiatra e diretor técnico da clínica psiquiátrica UNIICA

Machismo, um grande problema de saúde
Rolar para o topo
Pular para o conteúdo